sábado, 8 de novembro de 2014

Interstellar (2014)

«Eu sou a ressurreição e a vida. Aquele que crê em mim, ainda que morra, viverá; e quem vive e crê em mim, não morrerá eternamente.»

Christopher Nolan teve a sorte e o azar de ter começado a carreira perto da viragem do século. A sorte, porque tal lhe permitiu dispor já dos meios tecnológicos e da filmografia de base - Stanley Kubrick, Andrei Tarkovsky e Terrence Malick, citando apenas os mais importantes - que tornaram possível a criação de INTERSTELLAR. O azar, porque o advento da Era da Informação o deixou mais vulnerável às falhas (e ainda são algumas) que lhe apontam enquanto realizador. A verdade, contudo, é que, a cada filme que passa (e vamos no nono), Nolan continua a entregar obras capazes de homogeneizar a opinião de grande parte da crítica e, sobretudo, do público.


Uma equipa de astronautas, face ao esgotamento dos recursos da Terra, é enviada para o espaço em busca de um novo planeta que sirva de lar à Humanidade. É essa a premissa de Interstellar, o mais evidente à superfície, ainda que o seu verdadeiro escopo seja imenso, demasiado para que caiba numa sinopse tão simples.

Nolan volta a brincar às sinédoques e aos duplicados - o todo pela parte, a parte pelo todo -, como já o havia feito em The Prestige, trocando a humanidade das suas personagens pela Humanidade em geral. Vejamos, o pathos do indivíduo - e os filmes do inglês sempre viveram muito desse sentimento de dor e angústia - passa aqui a pathos de toda uma espécie que enfrenta a extinção, ao mesmo tempo que todo o seu destino se encontra depositado sobre os ombros de um só homem. E Cooper, o [h]omem (um Matthew McConaughey acabadinho de sair da sua consagração), honra o peso da responsabilidade que carrega com as suas decisões, confundindo-se, outrossim, com todos os seus semelhantes - a certa altura uma das personagens repara que o Brand de Michael Caine hipotecou a sua humanidade em prol da Outra -, conservando a [H]umanidade.

Tal como Malick em The Tree of Life, Nolan pergunta, afinal, o que é ser humano. A resposta que encontra vai para além da mera sobrevivência: trata-se de conservar a compaixão, o altruísmo e, às tantas percebe-se, o Amor. É essa a mensagem enfiada nas quase três horas de filme.

E pese embora Nolan nem sempre se revela à altura das suas influências - falta-lhe, por exemplo, o génio analítico de Kubrick, a poesia de Malick, ou a veia filosófica de Tarkovsky -, é de lhe admirar o desejo de criar um épico à sua imagem, o exercício de cinefilia a que tão profundamente se entrega. Quer isto dizer que Nolan, mesmo não se tratando de um exímio tarefeiro - será, sobretudo,  um cineasta de público -, consegue, ainda assim, uma obra merecedora das que lhe antecederam, uma vénia muito digna aos Mestres do passado.

Talvez se venha a escrever sobre Interstellar, daqui a vinte, trinta, quarenta anos, com o mesmo carinho com que hoje se escreve sobre 2001: A Space Odyssey ou  Solyaris (filmes superiores, daqueles que nos assombram muito após os termos deixado). Ou talvez se perca entre a restante filmografia de Nolan - à semelhança do que aconteceu com Insomnia e The Prestige, ofuscados pela maior dimensão mediática de obras menores - como uma nota de rodapé do que foi o Cinema de início deste século. Aconteça o que acontecer, Interstellar deverá ser relembrado como o filme que devolveu Nolan à sua melhor forma. E isso, quanto a mim, já lhe justifica o elogio rasgado, rasgadíssimo, que hoje lhe faço.


Título Original: Interstellar (EUA/Reino Unido, 2014)
Realizador: Christopher Nolan
Argumento: Jonathan Nolan, Christopher Nolan
Intérpretes: Matthew McConaughey, Mackenzie Foy, Anne Hathaway, Michael Caine, Jessica Chastain, Matt Damon
Música: Hans Zimmer
Fotografia: Hoyte Van Hoytema
Género: Comédia, Drama
Duração: 169 minutos


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